segunda-feira, 17 de julho de 2017

Tenho tantas saudades tuas


Esta fotografia não foi tirada por mim. Desculpa, avó.

Foi-me recomendado pela minha psicóloga que te escrevesse algo. Deveria ser em papel, mas vou fazê-lo aqui. Por alguma razão, apetece-me. Mas para te ser sincera não sei o que te dizer. Sinto que deixei muito para dizer e que agora não sei por qual ponta hei-de pegar. Mas vou tentar.


Sinto imensas saudades tuas. Não fazes ideia do quão estranho isto é para mim... Quero dizer, é como se não sentisse que partiste. Como se ainda não acreditasse nisso. E não acredito, para te ser sincera. E é isto que se torna tão estranho para mim, saber que já cá não estás, mas não sentir que foste. Não acreditar que já partiste. Será algo bom ou mau? Já não sei distinguir. Talvez isto esteja a acontecer por eu não ter ido ao teu funeral. E esse é outro assunto que agora me faz sentir culpada a toda a hora.

Já fui ao cemitério visitar a tua campa. A campa onde estás agora com o avô, único amor da tua vida. Mesmo estando lá e vendo tudo aquilo... E mesmo depois de ter chorado tanto lá... Porque é que continua a não parecer real? Parte de mim acha que tudo isto é só um pesadelo e que, quando entrar na tua casa, te vou encontrar lá. A outra parte de mim sabe que isso é uma grande mentira, e impede-me de lá ir.

Apesar de já ter ido visitar-te a ti e ao avô no cemitério, ainda não tive a coragem de entrar na tua casa. Não consigo. Sei que quando o fizer e vir a divisão que era o teu quarto se vai tornar tudo real. Essa divisão já nem é um quarto, foi transformada numa pequena sala no dia a seguir ao teu funeral. Mas eu não a vi ainda, porque não consigo entrar na tua casa. Nem do portão eu passei, sequer. Devia enfrentar isto como mulher crescida que tu dizias que já sou, mas não consigo. Não quero cair naquela tão dolorosa realidade. A realidade em que tu não estás cá. Tenho-a evitado ao máximo, porque sei que quando ela me atingir, vou cair violentamente no chão.  Sei que me ensinaste a levantar logo a seguir a uma queda, mas desta vez eu tenho medo de cair. Não quero cair.

Evito chorar porque evito pensar que realmente já não estás presente. Não fiz o devido luto como lhe chamam por isso mesmo. Não quero acreditar nisso. A outra parte de mim prefere acreditar apenas que tu estás por aí algures, a ser bem tratada e a ter mais momentos felizes. Mas essa parte de mim está tão enganada...

Achei que não iria aguentar ir ao teu funeral, por isso escolhi não ir mesmo antes do pior acontecer. Nem sequer te queria visitar no hospital ou até mesmo em tua casa. Não queria ficar com aquela imagem de estares fragilizada, à beira daquilo que ninguém quer que aconteça. Agradeço à minha mãe por ter insistido comigo para eu te fosse ver. Quando te visitei no hospital não foi tão mau, mas quando te visitei mais tarde em casa... Já sabias que era só uma questão de dias, não sabias? Abraçaste-me como se soubesses que aquela podia ser a tua última oportunidade. Talvez soubesses mesmo, ou calculaste que fosse.

Na altura eu não pensava nisso. Estava mais preocupada em estar presente para ajudar a minha mãe a ser forte. A tua filha mais sentimental, digamos. Era com ela que eu mais me preocupava na altura e, tendo a cabeça nisso, não me permiti a pensar em mais nada. Mas ao não ir ao teu funeral acabei por não estar lá para o teu último momento, nem para apoiar a tua filha mais nova. De certa forma, sinto que desiludi as duas ao mesmo tempo, uma vez que não lá estive nem para uma, nem para a outra. Não pensei que me pudesse sentir tão culpada nos dias de hoje, mas sinto.

Peço desculpa por não lá ter estado. Peço desculpa por não estar a lidar com isto como devia. Mas nem todos somos iguais, e cada um vai aguentando como pode ou acha que consegue. Apesar das gigantescas culpas que sinto, esta é a melhor maneira para mim de lidar com a situação, de modo a que eu não mergulhe já de cabeça na tristeza de já não te ter.

Sinto-te cá mas já não te sinto ao mesmo tempo.
Tenho tantas saudades tuas, avó.
Todos temos.


2 comentários

  1. Querida Nessie como eu te entendo!
    Perder alguém que amamos é uma dor tão grande que não há forma de a descrever. Uma ''mulher crescida'' também tem os seus momentos de fragilidade e precisa de colo e não tens de te sentir mal por isso. Faz o teu luto à tua maneira, não te preocupes com comentários alheios, leva o tempo que precisares para encarares esta realidade tão dificil. Não te vo dizer que tudo vai passar, mas garanto te que tudo se tornará mais leve com o passar do tempo.
    Não te culpabilizes por não teres estado lá no ultimo momento como lhe chamas te, de certeza que não desiludis te ninguém, o teu coração estava lá, o teu amor estava lá, a tua dor estava lá, a tua saudade estava lá...
    Guarda as boas lembranças, aquela palavra amiga, aquele abraço caloroso, guarda tudo o que tiveram de bom isso vai continuar a alimentar esse amor que apesar de parecer agora doloroso no final te fará um bem enorme sempre que te lembrares dele.

    Um beijinho enorme

    PS:eu também ''não estava lá'' há 10 anos atrás

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    1. Muito obrigada pelas tuas palavras, fofinha...
      Beijocas ♡

      (P.S: O link do instagram que metes na tua assinatura é apenas do instagram e não do teu perfil. Só para te alertar, caso não saibas.. Beijocas!)

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